quarta-feira, 16 de maio de 2012

Delta poderá manter contratos com União mesmo se considerada inidônea





Publicado no jornal O Globo – 16-05-12


O governo federal poderá manter os atuais contratos firmados com a Delta Construções mesmo se a empreiteira for considerada inidônea pela Controladoria-Geral da União (CGU). A Lei de Licitações nº 8.666/93 impede que a empresa considerada inidônea realize novos contratos com o poder público enquanto perdurarem os motivos da punição ou for reabilitada pela autoridade que aplicou a penalidade, mas deixa brechas jurídicas quanto ao cancelamento dos contratos vigentes. O Palácio do Planalto estuda manter a empreiteira, investigada por suspeitas de irregularidades, em projetos públicos em fase de conclusão, para não atrasar o cronograma de obras.

Os analistas jurídicos ouvidos pelo GLOBO observam que há margem para o governo federal realizar uma espécie de pente-fino nos contratos vigentes, suspendendo apenas aqueles nos quais forem constatadas irregularidades. Nesse caso, seria necessário instaurar processos administrativos individuais e dar direito de defesa à construtora, que poderá recorrer tanto em esfera administrativa como judicial. Em entrevista, concedida na semana passada ao GLOBO, o ex-presidente da Delta Construções Carlos Alberto Verdini afirmou que caso a construtora seja considerada inidônea, seria “legítimo” ajuizar uma ação judicial.

A J&F Holding, nova administradora da empreiteira, afirmou não haver posição consolidada sobre o tema, uma vez que ainda realiza processo de auditoria sobre ativos e contratos para bater o martelo sobre a aquisição da empresa. Uma fonte da J&F Holding informou que a inidoneidade pode pesar na decisão de compra da Delta Construções. A construtora Gautama, acusada de comandar um esquema de corrupção investigado pela Operação Navalha da Polícia Federal em 2007, foi declarada inidônea pelo governo federal e, até hoje, está impedida de firmar contratos com a administração pública. A Delta Construções possui atualmente R$ 4,5 bilhões em duzentos contratos com o poder público.

- A atual jurisprudência entende que a aplicação da sanção de inidoneidade passa a gerir os seus efeitos apenas da aplicação para frente, não retroagindo para atingir os contratos vigentes. Essa é a posição majoritária da jurisprudência. No entanto, a lei traz a possibilidade de que cada ente contratante possa reverter os contratos com base na possibilidade de rescindir o contrato administrativo, em razão do descumprimento de suas obrigações – explicou o advogado especialista em direito administrativo Bruno Aurélio, da Cascione, Pulino, Boulos & Santos Advogados.

Bruno Aurélio observa que se o governo federal cancelar os contratos vigentes, em um processo administrativo único, poderá gerar uma “fragilidade jurídica”, que poderá ser questionada judicialmente. O coordenador da especialização em direito comercial da PUC-SP, Marcus Elidius Michelli, alerta quanto ao risco da declaração de inidoneidade ser prejudicial ao governo federal, já que, em alguns casos, a empreiteira pode ter recebido mais recursos do que aplicou até o momento na obra para qual foi contratada.

- Às vezes, a declaração de inidoneidade da empresa pode ser mais prejudicial para o próprio governo federal, pois, ao encerrar o contrato durante a execução da obra, a empresa pode ter recebido mais do que fez. Então, é preferível que não se interrompa o contrato naquele momento e se execute a obra até o ponto que ela recebeu. Se não, o prejuízo pode ser ainda maior para o governo federal - avaliou.

- A administração pública tem de estudar contrato por contrato, para avaliar a inidoneidade do contrato. Não pode cancelar todos os contratos. A inidoneidade é para novas contratações. Nas anteriores, precisa haver uma análise - acrescentou o jurista e especialista em direito comercial, Modesto Carvalhosa

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